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Com 39 m², apê com paredes móveis e mobília inteligente pode ser alternativa à falta de espaço

Apê de 39 m² em NY tem paredes móveis e atinge 102 m² de área útil, pela modificação dos ambientes - Trevor Tondro/ The New York Times
Apê de 39 m² em NY tem paredes móveis e atinge 102 m² de área útil, pela modificação dos ambientes Imagem: Trevor Tondro/ The New York Times

Penelope Green

Do The New York Times, em Nova York

07/08/2012 07h12

Nova York - Pode ser que a casa do futuro seja um apartamento – com 39 m², bem pequeno - em um prédio residencial secular na Sullivan Street. Branco e brilhante, esse apê tem paredes móveis que permitem transformar um ambiente em seis, além de mobília expansível e ar filtrado - ou “do campo” -, como disse o proprietário Graham Hill, recentemente, enquanto exibia os truques conversíveis do imóvel como uma Bernadette Castro dos dias de hoje, vestido corretamente com uma camisa pólo de lã merino preta, calças pretas e tênis pretos da marca Vans.

Este laboratório, como Hill o chama, de pequenos espaços, sustentável e – é preciso enfatizar – de alto padrão é o primeiro produto tangível de sua companhia, a LifeEdited. O empreendimento vem com um estranho manifesto que, apesar disso, consegue reunir um bocado de filosofias e tendências sociais e econômicas, incluindo pesquisas de felicidade, o expansivo campo do consumo colaborativo e dados demonstrativos sobre cidades eficientes.

Esta é uma mistura de sistemas novos e antigos que soarão familiares para frequentadores assíduos de palestras do TED - onde Hill foi um palestrante -, para frequentadores da seção de auto-ajuda em livrarias e até mesmo para urbanistas da velha guarda ou fãs de Buckminster Fuller.

“Projetar sua vida para incluir mais dinheiro, saúde e felicidade com menos coisas, espaço e energia”, como diz o manifesto, é tanto um bocado de palavras quanto um paradoxo para uma empresa que espera estar no mundo das vendas, muito parecido com as ondas das mais novas dietas milagrosas que prometem perda de peso se você devorar todas as suas comidas favoritas.

Inspirado e empreendedor

Hill, o fundador do TreeHugger, um website que deixou o ambientalismo um tanto atraente e inspirador ao promover uma visão moderna e global do design sustentável (pense em galinheiros arquitetônicos, telhados verdes e condomínios “éticos”), mostrou que Hill pode obter lucros com seu idealismo sincero e seu bom gosto. Afinal de contas, o empresário vendeu o site em 2007 para a Discovery Communications, dona do Discovery Channel, por US$10 milhões.  

Hill, 41 anos, canadense, formou-se arquiteto e designer de produtos. O TreeHugger, que nasceu em 2004, foi seu segundo investimento na internet. O primeiro, uma empresa de web design, foi vendido em 1998 também por US$10 milhões, certamente seu número da sorte. 

“O Graham vem de uma rara linhagem, a do idealista pragmático”, diz Nick Denton, fundador do Gawker Media. Foi Denton que ofereceu a plataforma de blogging do Gawker como template para organizar o TreeHugger em seus primeiros passos. Em troca, Hill lhe deu uma parte do negócio.

“Ele está longe do mínimo esforço e do idealismo vazio”, acrescenta Denton. “Acho legal que o Graham crie um modo sustentável de viver nas cidades ao invés de exibir painéis solares de milhões de dólares em casas no Napa Valley, que não é o modo como a maioria das pessoas vive”, alfineta.

  • Trevor Tondro/ The New York Times

    Os condimentos ficam acondicionados nos círculos magnéticos aplicados do lado de fora do móvel

“Sempre teve a ver com burgueses no paraíso, não é?”, continua Denton, referindo-se ao público do TreeHugger, hoje preparado para ser o consumidor do LifeEdited.

“O pequeno é sexy”

Se fosse questionado, Hill lhe diria que lhe exigiram que selecionasse suas coisas para que coubessem em uma mala pequena e que isso fez com que ele se apoderasse da noção de “pequeno” como um plano de negócio.

“O pequeno é sexy”, ele diz em uma palestra de seis minutos: um sucesso no YouTube, com mais de 1,3 milhões de acessos até então. Tal manifesto também contém os seguintes aforismos: “troque propriedade por acesso”, “possua o mínimo possível para não ter que guardar muito” e “editar é a habilidade deste século: editar espaço, consumo de mídia, amigos”.

Graham Hill certamente não é o primeiro a anunciar os benefícios de uma vida simples. Há uma ligação direta entre Buckminster Fuller e Sarah Susanka, a arquiteta e autora de “Not So Big House”, publicado em 1998 no auge da expansão das McMansões do país, e entre o pessoal do Tiny House, os construtores de microcasas.

Existem as pessoas que acumulam, as pessoas que prezam pela simplicidade e autores como Dave Bruno, que escreveu um livro sobre editar suas posses até chegar a 100 coisas. Barbara Flanagan, arquiteta, designer de produtos e escritora, passou Bruno em dois itens com seu livro de 2008 “Flanagan Smart Home: The 98 Essentials for Starting Out, Starting Over, Scalling Back”.

O projeto

Em 2009 e 2010, Hill comprou dois apartamentos em um prédio residencial na Sullivan Street: um cubo de 39 m² por US$287 mil e outro de apenas 32 m² por US$280 mil. Ele se alojou no menor e lançou o concurso de um projeto para o espaço maior, com um briefing que incluía a necessidade de uma mesa de jantar para 12 pessoas e quarto de hóspedes, entre outras comodidades.

Surgiram mais de 300 candidatos e Catalin Sandu, uma estudante de arquitetura da Hungria - e hoje empregada por Hill -, venceu com seu apartamento-transformer, em um processo de seleção promovido pelo site TreeHugger.

 “O LifeEdited tem a ver com ter menos com que se preocupar e já estou preocupado com algumas coisas”, ele disse. “Precisamos fazer coisas mais baratas e mais resistentes. Essa parede móvel é muito cara.” (Seu mecanismo custa cerca de US$ 4.850 e foi fabricado por um produtor de estantes para livrarias.)

“Como podemos construir uma parede de baixo custo que seja segura e funcione bem? É tudo muito caro, mas é também um laboratório. Estou acostumado a isso com o TreeHugger. Tínhamos coisas caras no início. Há um papel - e acredito que um bom papel - a ser cumprido pelos primeiros consumidores e pelas pessoas com dinheiro. Isso ajuda a mostrar os produtos e aumentar seus volumes de vendas, assim os preços podem baixar.”

Custos e comodidades

Tudo incluso, a reforma do apartamento custou cerca de US$ 365 mil, US$ 50 mil dos quais foram utilizados para acelerar a entrega pela construtora. Já que o objetivo é oferecer apartamentos que economizam uma significativa quantia de dinheiro das pessoas, Hill sugeriu este cálculo como modo de diminuir o peso da etiqueta da Sullivan Street: ele aumentou a metragem (considerando o) dos ambientes criados pelo apartamento – cozinha, banheiro, sala de estar, sala de jantar, escritório, quarto principal e quarto de hóspedes –  ou seja, 102 m².

 “Olhando por este prisma,” argumenta o empresário, “você está levando a funcionalidade de um apartamento quase três vezes maior. Ok, você só pode usar um espaço por vez e isso exige uma transformação, mas mesmo assim…”

Sullivan Street é um ecossistema especial, uma micro-vizinhança de prédios residenciais centenários e cafés hipsters como o “Local” - que serve sanduíches vindos direto da fazenda e construiu um miniparque em uma vaga de estacionamento em frente à vitrine. Os “notáveis exemplos de preservação da vida dos imigrantes italianos na virada do século em Nova York”, como afirma Andrew Berman - diretor executivo da Sociedade do Greenwich Village para a Preservação Histórica – “são o motivo pelo qual está trabalhando para conseguir que o local, a sul do Washington Square Park e conhecido como South Village, seja classificado como distrito histórico”.

E o prédio na Sullivan Street, onde Hill está trabalhando sua ecotopia, “não é a residência padrão”, eclarece Berman. “É um lugar muito interessante, um modelo residencial construído em 1911 por uma organização fraterna de imigrantes italianos para a explícita proposta de criar habitações que fossem mais humanas, limpas, arejadas e ensolaradas que as outras casas da região, que foram construídas para abarrotar o maior número de pessoas possível, dentro dos limites da lei”.

Existem ironias aqui, é claro, entre elas a ideia de transformar habitações da classe trabalhadora em apartamentos de luxo para nômades endinheirados e sem filhos como Hill. 

Sábado, uma das vizinhas do empresário, Angela D’Arcangelo, parou para inspecionar a construção finalizada. Ela conta, espiando pela porta, que fez 102 anos em junho e que vivia no prédio desde os 6 anos. “Muito bonito”, disse, finalmente. 

Será que Hill imagina como é viver aqui tanto quanto D’Arcangelo viveu? O empresário parecia horrorizado ao responder: “não penso em décadas”.