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Escritora britânica busca casas dos sonhos e as usa em seus livros

Na sala de estar do bangalô inglês ficam visíveis as estruturas rústicas e robustas - Andy Haslam/ The New York Times
Na sala de estar do bangalô inglês ficam visíveis as estruturas rústicas e robustas Imagem: Andy Haslam/ The New York Times

Steven Kurutz

Walberswick, Suffolk, Inglaterra

20/04/2015 07h02

Esther Freud visitou Walberswick, uma vila na costa de Suffolk, na Inglaterra, pela primeira vez há 30 anos. Ela era uma jovem atriz vivendo em Londres, estava ‘farta da vida na cidade’ e se queixou um dia para o pai, o pintor Lucian Freud. Ele, que morreu em 2011, disse: “Existe um terrível e sombrio local onde eu precisava estar na minha infância, mas talvez você goste de lá”. Depois disso, lembra Esther, ele ligou e fez alguns arranjos.

A moça se hospedou em uma casa chamada de ‘Casebre Oculto’, um bangalô com “janelas de vidro enormes e fantásticas”, recorda ela. Era novembro, estava frio e úmido e, assim como os artistas que se reúnem em Walberswick à procura de um ambiente tranquilo e iluminação natural de qualidade, ela adorou: “Era o lugar mais maravilhoso no qual eu havia estado. Continuei voltando e, por anos, meu sonho foi ter uma casa na vila”.

O sonho da escritora

Esther, hoje com 51 anos e autora de oito livros, possui uma morada no vilarejo: um robusto chalé com quatro quartos, construído com pedra e detentor de um impressionante telhado vermelho. O lugar serve como um refúgio para ela, o marido e os três filhos e sua construção data dos século 18, o que torna a casa, talvez, a mais antiga das cerca de 400 construções na vila.

No interior, velhas estruturas foram deixadas à vista, com as enormes vigas que dominam várias salas. Partes da edificação conservam seu teto alto e inclinado, como se você estivesse em um celeiro, enquanto outros cômodos refletem a arquitetura de pés-direitos diminutos e pouca iluminação, comum nos idos de 1700. Esther, porém, conta que mandou aumentar a altura das portas, para que seu marido, o ator David Morrissey, não batesse com a cabeça.

A altura das aberturas foi um problema também na primeira casa que a escritora teve na vila, bem ao lado da atual e que inspirou seu último romance “Sr. Mac e Eu”. A casa apertada havia sido um pub e uma pousada chamada Âncora Azul. Mas esta não foi a primeira vez que a escritora utilizou a costa de Suffolk como cenário de um a trama, o livro “A Casa do Mar”, de 2004, já se orientava pelo local.

Há um tema pessoal aqui?

“Alguém escreveu certa vez que você só sabe o que realmente interessa a alguém, quando esta pessoa já tiver escrito alguns livros. As casas sempre me chamaram a atenção. Até pensei certa vez: ‘Oh meu Deus, eu quero morar em todas elas’”, explica Esther.

E este interesse pode estar no ‘sangue’. O arquiteto, personagem de “A Casa do Mar”, foi baseado em seu avô paterno, Ernst Freud, um projetista bem-sucedido, que fugiu da Alemanha nazista para a Inglaterra, em 1933, onde retomou sua carreira. “Ele passou muitos anos vivendo em Walberswick, também. Há casas dele em todos os lugares aqui, casas de campo que ele transformou em estruturas estilo Bauhaus”, conta a escritora.

Contudo, Esther atribui seu interesse pelas moradas ao fato de que, enquanto crescia, nunca teve um lar permanente. Ele e sua irmã mais velha, a estilista Bella Freud, tiveram uma infância itinerante. Seus pais nunca se casaram e, no auge da década hippie de 1960, sua mãe as levou para viver no Marrocos, período que ela registraria em seu aclamado primeiro romance, “Hideous Kinky”.

A mudança e a busca

“Nós mudávamos, mudávamos e mudávamos. Isso fez com que eu ficasse obcecada em encontrar a casa dos meus sonhos. Mas eu adorava me mudar, o que tornou impossível encontrar a residência perfeita. É uma mistura engraçada”, confessa Esther. Apesar de gostar de casas, a escritora é menos entusiasta quando o assunto é a decoração e descreveu seu estilo como “uma espécie de anos 50, um pouco fora de moda” e disse que gosta de encontrar móveis de segunda mão, como a cômoda vitoriana verde que ela comprou no Mercado de Portobello e colocou na cozinha do chalé.

Depois que a escritora conquistou seu refúgio campestre em Walberswick - um lugar onde há tanta história familiar e no qual sonhou por tanto tempo em possuir uma casa - , ela sentiu satisfação e alegria? Bem, não exatamente. A infância inquieta continua intrínseca: “Quando finalmente compramos esta casa de campo, eu me lembro de ter sentido uma mistura de felicidade e um certo vazio, porque eu iria parar de procurar a casa. Eu gosto do sonho. Eu gosto de fantasiar”, conclui.