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Casa dos anos 40 tem jardins tropicais de Burle Marx, piscina e bosque

Giovanny Gerolla

Do UOL, em São Paulo

05/05/2015 07h00

O Instituto Moreira Salles (IMS), na Gávea, bairro do Rio de Janeiro, guarda memórias: a construção onde hoje funciona a sede carioca do centro cultural foi a residência do empresário, banqueiro, advogado e diplomata Walter Moreira Salles desde a década de 1950. A construção tem projeto do arquiteto Olavo Redig de Campos, modernista que trabalhou com o paisagista Roberto Burle Marx. Por isso, seus jardins são uma história à parte.

O projeto de arquitetura, do final dos anos 1940, foi desenvolvido para uma localização ainda muito ‘selvagem’, junto ao Parque da Cidade. Do lado de fora do volume construído, o vasto jardim de com piscina, painel de azulejos, jardim aquático e mata densa tropical ganharia forma na década de 1950 na prancheta de Burle Marx e, desde 1995, passaria a ser mantido pelo IMS.  

Roberto, o ávido

Burle Marx era brasileiro, mas teve seu primeiro grande embate com a vegetação nativa do país no jardim botânico de Dahlem, em Berlim. Com olhar modernista, descobriu a possiblidade de se expressar a partir de elementos da mata tropical. Com eles, passaria a dar forma e vida a suas ideias, não mais no plano bidimensional das telas, mas em três dimensões no paisagismo, com o toque forte do realismo das texturas e das cores.

Na Europa, foi influenciado pelo Cubismo e pelo Expressionismo e se dedicou à técnica do desenho rigoroso fundado em pesquisas botânicas. Estudou ecologia, topografia, e se inspirou nas estruturas dos vegetais para criar as composições plásticas dos espaços que projetaria.

Selvagem?

Os jardins do IMS, bem ao pé do morro Dois Irmãos e com pedra da Gávea em seu horizonte, são ótimos exemplos de como a topografia do terreno, o tipo de solo e outras (possíveis) limitações locais são utilizadas por Burle Marx de forma positiva para a concepção paisagística. Tais elementos definem os microclimas com que Burle Marx trabalha e determinam as áreas de sol ou sombra, dão o ritmo do claro e do escuro e do mais ou menos denso. O resultado é uma associação contrastante e, ao mesmo tempo, muito orgânica e de grande amplitude cromática das espécies vegetais.

A naturalidade em usar elementos “da terra” na concepção do espaço, porém, não era exclusividade da porção "viva" de seu trabalho e pode ser vista, também, na arte de Burle Marx. O paisagista, que também era pintor, fez do uso tradicional da azulejaria portuguesa um trampolim para a expressão do então Brasil Modernista. No painel junto ao espelho d’água da casa, a tonalidade azul típica se alinha à temática social, no melhor estilo de Cândido Portinari, para compor uma imagem poética das lavadeiras.

Restauro

Hoje, o jardim é quase o mesmo de 65 anos atrás. Mas a beleza, mesmo a natural e (quase) selvagem carece de cuidados e, em meados dos anos 1990, Isabel Duprat - que foi estagiária do mestre paisagista - comandaria uma primeira recuperação do paisagismo, época que a casa passou a abrigar o centro cultural.

Em 2013, seria a vez da segunda intervenção, feita pelo escritório de paisagismo Burle Marx, que restaurou o painel cerâmico decorado com 87,5 m² e 4.016 azulejos. A residência do banqueiro que virou centro cultural - e até personagem, no documentário "Santiago" (2007) do cineasta João Moreira Salles - é, também, um traço preciso na história da arquitetura brasileira e vale a visita. Para conhecer mais do Modernismo nacional no concreto ou na paisagem, dê uma passada pelo IMS do Rio.

Leitura sugerida: Guia dos Jardins de Roberto Burle Marx no Instituto Moreira Salles, Instituto Moreira Salles, 2009.