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Erros de chefes são mais tolerados, exceto quando são graves

Pesquisas mostram que comportamentos inapropriados de chefes são mais tolerados, mas quando o erro é muito graves, as punições são mais severas do que seriam a um subordinado - Thinkstock
Pesquisas mostram que comportamentos inapropriados de chefes são mais tolerados, mas quando o erro é muito graves, as punições são mais severas do que seriam a um subordinado Imagem: Thinkstock

Jane Williams

The New York Times News Service/Syndicate

11/03/2013 16h43

Quando se trata de infrações no escritório, os líderes parecem se safar de muitos problemas que custariam o emprego de seus subordinados. Aparentemente, as pessoas fecham os olhos quando o gestor usa o cartão de crédito da empresa para cobrir os 200 dólares de um almoço particular, mas um funcionário pego na cantina do escritório enfiando uma lata de refrigerante na mochila pode perder o emprego.

Contudo, há um limite até mesmo para os cargos mais altos. Novas pesquisas da escola internacional de negócios Insead sugerem que os líderes geralmente recebem mais leniência quando apresentam comportamentos antissociais ou inapropriados, mas quando exageram --ou seja, quando seus comportamentos são considerados "muito graves"--, enfrentam punições ainda mais pesadas do que as de um subordinado.

"Pesquisas mostram que, por conta de seu poder e status, líderes recebem certos privilégios", afirmou Natalia Karelaia, professora assistente de ciências da decisão na Insead, além de coautora do artigo "When Deviant Leaders Are Punished More than Non-leaders: The Role of Deviance Severity" ("Quando Líderes com Desvio Comportamental são mais Punidos do que Não-Líderes: O Papel da Gravidade do Desvio Comportamental", em português).  "Mas geralmente se espera que os líderes ideais ajam de forma responsável e justa. Por isso, quando cometem desvios graves --que causam danos reais a outras pessoas--, suas ações passam a ser vistas como atos que contrariam as expectativas em relação ao papel de um líder".

Pesquisas anteriores sugerem que poder demais pode levar a comportamentos socialmente inapropriados e imorais. Na verdade, há evidências que sugerem que esse tipo de comportamento abunda entre pessoas poderosas, uma vez que romper regras, correr riscos de forma agressiva e agir de maneira incontrolada são traços relacionados a líderes de sucesso e, por essa razão, são aceitos até que se tornem graves demais para serem ignorados. Para que o comportamento questionável seja considerado severo, ou dentro das normas da sociedade, é preciso conhecer o nível de danos que os atos causam às outras pessoas, afirmou Karelaia. Portanto, esses dados são subjetivos e abertos à manipulação, o que dá à mídia muito poder em relação à forma como os líderes são punidos.

Basta ver o exemplo de Rupert Murdoch, CEO da News Corporation, o conglomerado de mídia global. As táticas operacionais adotadas por sua empresa praticamente não foram supervisionadas, o que levou repórteres a espionarem as vidas privadas de estrelas de cinema e de políticos em busca de escândalos. Embora as "vítimas" em questões fossem figuras públicas e, portanto, legalmente sujeitas ao escrutínio público, os repórteres passaram dos limites. Quando foram feitas acusações a respeito do uso de escutas telefônicas na casa da família de uma criança assassinada, a condenação pública levou a uma investigação oficial a respeito das táticas utilizadas.

Isso também explica porque os chefes de alguns bancos sobrevivem a escândalos, como no caso de Jamie Dimon, do J.P. Morgan Chase, ao passo que outros, como Bob Diamond e Marcus Agius, respectivamente CEO e presidente do Barclays, não têm a mesma sorte. Quando foi revelado que o Barclays e outros grandes bancos haviam tentado manipular a taxa de juros LIBOR, afetando milhões de pessoas e trilhões de dólares em empréstimos estudantis, hipotecas e cartões de crédito, Diamond foi obrigado a se demitir.

 

Karelaia afirmou que "quando a mídia chama a atenção do público para o impacto de certas atitudes sobre funcionários, clientes e famílias, a percepção da magnitude do dano pode ser afetada. As descobertas de nossa pesquisa nos levam a crer que, ao mudar a magnitude do dano, podemos mudar a forma como os infratores são vistos".

O artigo de Karelaia se baseou em quatro estudos. Nos dois primeiros, os entrevistados eram convidados a se colocarem no lugar de consultores de RH, avaliando as ações de dois funcionários: o executivo sênior de uma grande empresa e um assistente de pessoal. Um deles fornecia descrições de quatro ações inapropriadas, que iam de atrasos a reuniões a assédio sexual no ambiente de trabalho, e pedia aos participantes para avaliar a gravidade de cada um e a severidade da punição dos infratores hipotéticos. A segunda pesquisa mantinha a natureza dos atos, mas mudava a extensão dos danos causados. Em ambos os estudos, as punições recomendadas para assistentes eram mais graves que as recomendadas para executivos em casos pouco graves, ao passo que os mais severos e com maiores danos às vítimas levavam os líderes a serem punidos com maior intensidade.

O terceiro e o quarto foram experimentos de laboratório nos quais os participantes tinham poder para punir as pessoas envolvidas em determinados comportamentos inapropriados, fossem membros da equipe ou líderes. Novamente, os resultados sugerem que o status de líder impede que as pessoas sejam punidas por comportamentos mais brandos, mas se torna uma desvantagem no caso de infrações severas. No quarto estudo, os participantes eram explicitamente informados de que a posição de liderança não envolvia nenhuma responsabilidade ou obrigação a mais, acabando com a diferença na forma como líderes e não líderes eram punidos por comportamentos negativos. Isso sugere que a sensação de que os chefes traíram suas responsabilidades levava a punições mais duras por atitudes consideradas severas.

"Foi reconfortante descobrir que o padrão consistente de resultados em todos os estudos claramente apoiava nossa hipótese de que a punição é determinada tanto pelo status de liderança quanto pela forma como a severidade do desvio é percebida por aqueles que punem", afirmou Karelaia.

 

Participantes de ambos os exercícios vieram da França e dos Estados Unidos, países onde pesquisas sugerem que o conceito de liderança seja glorificado.

"Em culturas onde se espera que líderes sejam mais humildes e modestos", acrescentou Karelaia, "imagino que os líderes sejam punidos com ainda mais severidade por desvios extremos".

Em casos nos quais os líderes são mulheres, é possível que o sentimento de traição e a punição sejam ainda maiores, em vista do estereótipo de que elas são pessoas que tomam conta das outras.

A governança corporativa evoluiu durante a última década e os líderes agora acham mais difícil transferir a responsabilidade por seus erros a advogados e especialistas financeiros. Ainda assim, muitos recebem polpudos pagamentos rescisórios depois de deixarem seus cargos e parecem imunes a maiores punições.

"Eu prefiro pensar que essas descobertas farão com que as pessoas pensem a respeito das consequências de maus comportamentos por parte de líderes", afirmou Karelaia. "Se continuarem cometendo pequenas transgressões, os líderes podem abrir um precedente para outras pessoas na empresa. Quando o líder não é punido por algo que não é muito ético, a cultura de uma empresa pode se deteriorar e o comportamento antiético pode se tornar a regra."

(Jane Williams é editora da Knowledge Arabia, uma empresa de consultoria com sede em Amã.)