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Você precisa de muito para ser feliz? Minimalistas pensam o oposto

O casal Samantha Shiraishi e Guilherme Nunes da Silva, com os filhos Giorgio (esq.), Manu (no colo) e Enzo - Arquivo pessoal
O casal Samantha Shiraishi e Guilherme Nunes da Silva, com os filhos Giorgio (esq.), Manu (no colo) e Enzo Imagem: Arquivo pessoal

Yannik D´Elboux

Do UOL, no Rio de Janeiro

17/10/2013 07h29

Simplificar a vida e se concentrar no mais importante é a essência do estilo de vida minimalista. Isso significa não acumular objetos, organizar a bagunça, descomplicar a rotina e ter tempo para fazer o que gosta e conviver com pessoas queridas. No minimalismo, movimento inspirado nas artes, a ideia é viver com menos. Porém, a opção, também conhecida como simplicidade voluntária, não tem a ver com falta de dinheiro. 

"É uma escolha típica de pessoas das classes média e alta, que, justamente por terem tido acesso à sociedade do consumo, se frustraram e optaram por outro estilo de vida", explica Jelson Oliveira, professor e coordenador do programa de pós-graduação em Filosofia da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).

O professor vem estudando o tema para escrever o livro "Simplicidade", último volume de sua trilogia "Sabedoria Prática", publicada pela Editora Champagnat, previsto para ser lançado este ano. Em seu diagnóstico, Oliveira nota que o apelo à simplicidade está crescendo como resposta ao cansaço do mundo do excessos, "que não é capaz de satisfazer os desejos humanos mais profundos".


A percepção de que não precisava de muitas coisas para ser feliz foi o que motivou Samantha Shiraishi, estrategista e ativista digital, 40 anos, a adotar um modo de vida minimalista. O aprendizado veio da experiência de morar com o marido no Japão, onde teve de abrir mão do espaço a que estava acostumada para viver em um espremido conjugado, em que até a cama (na verdade, um colchão japonês) ia para o guarda-roupa depois de usada, para o casal poder circular.

"De repente, eu não tinha mais nada daquela estrutura que estava habituada. Foi uma experiência de desapego", relembra Samantha. Além disso, o fato de ter passado por dois terremotos também influenciou a mudança de vida na volta para o Brasil. "Percebi que, para sobreviver, você não precisa de muito e que, às vezes, o excesso sufoca".

Consumismo

Atualmente, Samantha mora com o marido e três filhos em um apartamento de cerca de 80 metros quadrados em São Paulo. Ela busca manter poucos móveis e levar uma vida prática. Mas o exercício do desapego é constante. Recentemente, teve de se desfazer de uma mesa de jantar com seis lugares e uma cristaleira de madeira de mais de 80 anos, herança da avó, para sobrar espaço para a filha caçula, de quatro meses. "Não cabia mais na nossa vida".

Não acumular e consumir de forma consciente é um dos mantras do minimalismo no dia a dia. O instrumentista e professor substituto de Música da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Jorge Santos, 30 anos, pode ser considerado um exemplo de consumidor frugal, apesar de dispensar o rótulo de minimalista. "Tenho o hábito de sempre questionar a necessidade de comprar certos objetos", afirma.

Esse comportamento está tão enraizado na vida do músico que, às vezes, ele tem dificuldade de adquirir coisas novas, como óculos de sol, que vem cogitando comprar há quase dois anos. "Fico avaliando o quanto realmente preciso disso, se não é apenas desejo".

Jorge Santos também procura doar tudo o que não usa e se livra dos objetos com facilidade. "Não quero ficar preso. Minha vontade era poder me mudar e não ter nada para levar".

Para quem ainda não chegou a esse grau de desapego, mas gostaria de consumir com mais moderação, o professor e filósofo Jelson Oliveira recomenda fazer três perguntas básicas antes de efetuar qualquer compra: "Preciso?", "Preciso agora?" e "Posso pagar?". Depois de responder a esses três questionamentos, fica mais difícil gastar por impulso.

Vida simples

O estilo de vida minimalista não se resume à economia de bens materiais. Para os entusiastas da ideia, a intenção é simplificar tudo para ter menos com o que se preocupar e desfrutar melhor do que traz mais felicidade.

Na busca por esse objetivo, é comum aposentar o carro, que costuma implicar em gastos e complicações, procurar um emprego mais perto de casa, mesmo que se ganhe menos, mudar para um lugar menor, reduzindo assim as manutenções, entre outras atitudes que facilitem o cotidiano. Ter mais contato com a natureza e com os amigos também estão entre as prioridades dos minimalistas.

Samantha Shiraishi encontrou na simplicidade uma maneira de aproveitar mais a convivência familiar. Ela trabalha a poucas quadras de onde mora, assim pode almoçar com os filhos em casa e ter uma alimentação saudável. Possui um carro, que divide com o marido, também seu sócio. Além disso, a escola dos filhos fica no mesmo bairro, diminuindo os deslocamentos. Todas essas escolhas foram pensadas e geram tanto economia quanto mais tempo para a família.

"Fico feliz por poder fazer escolhas mais conscientes, sinto que não sou movida apenas pelas circunstâncias".