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Pessoas com "anorexia emocional" tentam evitar vínculos afetivos

Os "anoréxicos emocionais" sabem que podem dar amor, mas não têm ideia de que podem receber - Didi Cunha/UOL
Os "anoréxicos emocionais" sabem que podem dar amor, mas não têm ideia de que podem receber Imagem: Didi Cunha/UOL

Heloísa Noronha

Do UOL, em São Paulo

09/05/2014 07h31

As formas mais conhecidas de compulsão emocional são a sexual, cujos portadores transam de maneira incontrolável (e às vezes sem critérios na escolha dos parceiros), e a codependência, na qual pessoas investem em relacionamentos problemáticos, pouco saudáveis e o veem como base e objetivo de sua existência.

Existe um outro tipo, a chamada "anorexia emocional", cujas características revelam o contrário das demais, que, em geral, estão associadas ao exagero e falta de controle. Trata-se da dificuldade de estabelecer vínculos afetivos e de se envolver. A razão para que também seja considerada compulsão é que esta, segundo a psicologia, significa a força que induz a repetir um ato não deliberado, ou mesmo contrário à vontade.

Não é que a pessoa não queira amar e se relacionar com alguém, ela simplesmente não consegue. "Há uma espécie de bloqueio e o medo da rejeição é maior", explica o psiquiatra Joel Rennó Jr., coordenador da Comissão de Estudos e Pesquisas da Saúde Mental da Mulher da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).

De acordo com Rennó, o termo anorexia emocional não é uma classificação diagnóstica reconhecida pela psiquiatria, mas nem por isso é equivocado. Serve para denominar diversos exemplos, desde o caso da pessoa que vive um relacionamento atrás do outro, sem se aprofundar ou levar algum adiante, até quem já passou por diversas frustrações amorosas e prefere fugir quando um romance começa a engrenar, com medo de que dê errado. 

O termo é bastante empregado pelo grupo de autoajuda DASA (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos). “Alguns de nós podem não fazer sexo ou estar em um relacionamento há anos. Ou podem estar em um relacionamento e ter dificuldade de se sentirem próximos emocionalmente do outro. Muitos sequer têm amigos íntimos”, conta um membro do DASA que prefere se manter no anonimato (como a maioria de seus participantes).

São indivíduos que sabem que podem dar amor, mas não têm nenhuma ideia de que podem receber. Outros sabem apenas o que é responder às necessidades alheias, mas não conhecem as próprias. 

O psicólogo Jonathas Salatiel, do CRP/SP (Conselho Regional de Psicologia de São Paulo), lembra que a compulsão sexual também pode ser um dos sintomas da anorexia emocional. “O sexo pode ser uma maneira de aliviar a angústia e a ansiedade, pois traz uma falsa satisfação momentânea”, conta. E transar por transar, por maior que seja a intimidade física, não estabelece vínculo emocional.

Há quem tente minimizar a angústia com outras compulsões, como compras, jogos, comida, álcool ou drogas. Essas substâncias, segundo o DASA, ajudam a ter mais desinibição sexual, emocional ou social, mas mantêm uma distância do contato significativo com os outros.

Para o psiquiatra Joel Rennó Jr., o tratamento da anorexia emocional sempre começa pelo entendimento do passado, pois foi lá que acontecimentos como negligência, abuso, educação rígida, decepção ou traição se sucederam e provocaram o medo de se relacionar.

“Essas pessoas são muito resistentes a qualquer tipo de mudança, então para o presente se modificar é preciso buscar as razões do problema. Isso deve ser feito com apoio profissional, pois alguns casos podem revelar ainda transtornos mentais ou outros distúrbios emocionais”, afirma. Ele diz que os grupos de autoajuda são importantes para as pessoas se sentirem acolhidas, compreendidas, mas que só a terapia pode surtir o efeito desejado, já que leva em consideração a história de vida do paciente, que é única e singular.