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Maior liberdade sexual não facilita intimidade nos relacionamentos

Principalmente entre os jovens, existe uma falsa sensação de intimidade - Caio Borges/Arte UOL
Principalmente entre os jovens, existe uma falsa sensação de intimidade Imagem: Caio Borges/Arte UOL

Yannik D´Elboux

Do UOL, no Rio de Janeiro

08/01/2015 07h11

Passar do primeiro encontro ao ato sexual pode não demorar muito. A liberdade vivida pelas gerações atuais facilitou a concretização dos desejos, com muito menos tabus e culpa. No entanto, chegar mais rapidamente até a cama não significa desenvolver relações de intimidade na mesma velocidade.

"Hoje, cria-se rapidamente um espaço para a intimidade física; as pessoas podem ter sexo a hora que quiserem, mas não há intimidade emocional", diz o psiquiatra e terapeuta Dimas Calegari, autor do livro "Da Teoria do Corpo ao Coração" (Editora Summus), com base nas técnicas de Wilhelm Reich, psicanalista austríaco e seguidor de Freud. 

Ainda assim, na opinião do médico, a liberdade sexual é benéfica, pois facilita o contato físico, fundamental para a vida. Porém, Calegari acredita que essa é apenas a metade do caminho nas relações. "A outra é o nosso contato de alma, essência. E isso significa intimidade emocional", defende.$escape.getHash()uolbr_quizEmbed('http://mulher.uol.com.br/comportamento/quiz/2014/12/09/voces-tem-intimidade-sexual.htm')

É fácil confundir o relacionamento sexual com intimidade. Mas tornar-se tão próximo de alguém fisicamente nem sempre significa desenvolver uma ligação mais profunda. "É possível ter intimidade em relação à sexualidade, mas não ter intimidade em relação às emoções", explica Lina Wainberg, psicóloga e professora da especialização em Sexologia Clínica da PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul).

Para Lina, principalmente entre os jovens, existe, muitas vezes, uma falsa sensação de intimidade. "Eles falam de sexo com muito mais facilidade, mas não falam de afeto. As pessoas estão ficando cada vez com mais dificuldade em assumir os sentimentos", afirma.

A transitoriedade das relações, que acabam sendo quase descartáveis, na opinião da psicanalista Ariane Severo, também prejudica a intimidade e empobrece o vínculo amoroso. Para Ariane, autora do livro recém-lançado "O Suave Mistério Amoroso: Psicanálise das Configurações Vinculares" (Editora AGE), sem intimidade, muitos casais praticam o que ela chama de "sexo light". "É o sexo sem amor, que não enriquece a vida sensível, emocional, que não estreita a relação do casal além do embate carnal" opina.

Significado de intimidade

A interpretação do que significa intimidade varia conforme o contexto. Em termos genéricos, na visão da professora e pesquisadora da PUC-RS, a palavra representa proximidade afetiva. "Intimidade nada mais é do que poder sermos nós mesmos perante o outro, com todas as nossas nuances, qualidades, defeitos e angústias. E, ainda assim, ter a segurança de que esse indivíduo vai continuar do nosso lado", resume Lina.

Ficar íntimo de alguém pressupõe baixar as defesas, revelar-se sem medo de ser ameaçado. "Na verdade, nós só podemos ter intimidade à medida que nos dispomos a estar abertos e vulneráveis para a relação", afirma Dimas Calegari.

Para Ariane, também autora da obra "Encontros e Desencontros: A Complexidade da Vida a Dois" (Casa do Psicólogo), os relacionamentos mais íntimos envolvem um pacto silencioso, em que cada gesto traduz a intenção do outro. "A intimidade é algo profundo, em que as pessoas vivenciam a intuição do que o outro quer, necessita", destaca.$escape.getHash()uolbr_quizEmbed('http://mulher.uol.com.br/comportamento/quiz/2014/07/19/voce-e-seu-par-se-dao-bem-na-cama.htm')

Aprender a se expor e ouvir

Para os especialistas, o desenvolvimento da intimidade contribui para relacionamentos mais significativos e gratificantes, inclusive no âmbito sexual. Em uma pesquisa com 800 pessoas no Brasil, em relações estáveis, a professora Lina Wainberg chegou à conclusão que o nível de intimidade dos casais está relacionado à satisfação sexual.

Inicialmente, Lina acreditava que esse aspecto seria mais relevante para as mulheres, contudo não foi o que os resultados mostraram. "Nos relacionamentos de longo prazo, vimos que para os homens também é importante. Mais intimidade representa maior satisfação, tanto para homens quanto para mulheres", relata a pesquisadora.

Apesar de ser essencial e trazer satisfação, muitas pessoas fogem da intimidade, de maneira consciente ou não, por receio de serem machucadas pelo outro e também de perderem sua autonomia. "Alguns têm medo de se anular, de entrarem numa fusão, de serem engolfados pelo outro", diz Ariane Severo.

Para Dimas Calegari, permitir-se ficar verdadeiramente íntimo do parceiro aproxima a pessoa de sua essência, o que dá mais sentido à vida. Segundo o psiquiatra, para ter mais intimidade na relação é preciso se abrir e saber ouvir sem críticas ou julgamentos.

"Fale de você e dê tempo para o outro se expressar. Quando você fala de si, não está em posição de defesa, se expõe e amplia a vulnerabilidade. Isso torna a outra pessoa mais segura para também se expor", diz.