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Como lidar com o adolescente que não quer ir à escola

Uma conversa sem cobranças pode ajudar os pais a descobrirem o que está acontecendo com o filho - Thinkstock
Uma conversa sem cobranças pode ajudar os pais a descobrirem o que está acontecendo com o filho Imagem: Thinkstock

Camila Dourado

Do UOL, em Londres

31/07/2013 11h48

Não é raro ver a postura dos filhos mudarem diante da escola ao chegarem aos 12 anos. Em alguns casos, o rendimento cai, a lição de casa passa a ser uma tortura. Há até quem se recuse a frequentar as aulas. Por trás da alteração, podem existir situações pontuais que estão fazendo o jovem perder o interesse pelo colégio.

Há cerca de dois anos, A.O, 49, mãe de B.O, 13, mudou-se para um apartamento que ficava a apenas cinco minutos de uma escola. Era a possibilidade de o filho ter a liberdade de ir a pé para as aulas e voltar sozinho.

“No início, ele gostou da ideia, mas, depois de dois meses, passou a fingir que entrava na escola, escondia-se e, quando eu saía para trabalhar, voltava para casa. Fui alertada pelo porteiro do meu prédio”, conta a mãe.

A primeira iniciativa foi conversar com o garoto e com os responsáveis na escola. Ficou decido que ele voltaria a frequentar a instituição. Mesmo insatisfeito, ele concordou. Cerca de um ano e meio depois, um aluno passou a ridicularizar toda a classe, incluindo B.O. O garoto desmontou a carteira dele para que, quando sentasse, levasse um tombo. Resultado: a sala toda riu da situação. Bastou para que B.O mudasse seu comportamento de novo.

“No final do ano passado, me chamaram para uma reunião e disseram que meu filho estava muito estranho e que precisava ir a um psicólogo. Em uma conversa, perguntei o que estava acontecendo, mas ele travou. Nunca mais entrou na escola nem para buscar os livros e as outras coisas dele”, diz a mãe.


Desde outubro de 2012, B.O está com acompanhamento psicológico e deverá ser encaminhado a um psiquiatra. O motivo exato ainda não foi detectado, mas a “vergonha” que o colega de classe o fez passar está entre os motivos que o fizeram perder o interesse de frequentar a escola.

Outro exemplo é o caso de A.C.A, 13. Desde o ano passado, a jovem passou a demonstrar insatisfação com as aulas de educação física. Como não queria dividir com a família o que estava acontecendo, sempre que havia aula, inventava mal-estares.

No ano passado, fez vários exames de saúde para que descobrissem o que ela tinha. De todos os testes feitos, nenhum apontou qualquer problema. No início do ano letivo de 2013, ela revelou que não gostava da professora de educação física e que tinha pavor das aulas.

Depois de muita conversa na escola e busca por terapia, ficou decido que ela mudaria de colégio. Ninguém sabe o que, de fato, a garota vivenciou nas aulas da disciplina. De acordo com sua mãe, C.R, 33, algo deve ter sido dito que a deixou tão constrangida a ponto de ter crises de ansiedade nas noites que antecediam os dias em que teria essa matéria.

Histórias como essas não são raras. Muitas vezes, os jovens passam por situações de conflitos em sala de aula, mas poucas vezes elas se tornam conhecidas pelos pais ou pela escola. E só aparecem em momentos extremos. É bom ressaltar que nem sempre esses conflitos estão relacionados a um acontecimento específico. Às vezes, o desânimo se dá pelo próprio fato de precisar estudar.

A entrada na adolescência

A própria idade é uma questão a ser ressaltada. A partir dos 12 anos, o corpo muda, a mente muda. É um período que marca a entrada na adolescência e a puberdade. “É a fase da transformação física. A mente continua de menino e menina, mas o corpo, não. Isso causa um desencontro entre o universo social e o biológico”, declara o professor Lino de Macedo, do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, Desenvolvimento e Personalidade da USP.
 
Segundo Macedo, nessa fase, o núcleo familiar deixa de ser o porto seguro, e o jovem passa a valorizar mais a convivência com o meio social escolar.

Por isso, é muito comum, por conta da identificação com os colegas, o quadro de um aluno educado, estudioso, mudar. Ele passa a demonstrar certa rebeldia e começa a assumir gostos parecidos com os do grupo. Tudo isso faz com que diferentes conflitos sejam despertados.

“Crescer causa dor”, afirma a psicóloga e psicopedagoga Augusta Carvalho, especialista em adolescente. É um momento cercado de muita contradição e insegurança. “O adolescente tem medo dessa situação. Por isso, muitas vezes, perde o interesse pela escola para poder vivenciar por mais tempo sua condição de criança. Cria-se uma batalha interna entre o abandono da infância e o enfrentamento da realidade do mundo adulto”, fala.

A identidade fica muito confusa.  “O jovem não quer ficar em casa, não quer regras nem limites, não quer ir para a escola, não quer ir para o inglês. Nessa fase, o adolescente cria uma hostilidade frente aos pais e ao ‘mundo’, que, em geral, se manifesta por meio da desconfiança e da ideia de não ser compreendido.

É comum que use desculpas como “o professor de matemática está me perseguindo”, “a professora de química não sabe explicar”, “a orientadora não entende o que eu falo”. A culpa é dos outros, não dele.

Com todos esses conflitos internos, ao enfrentar o mundo adulto, que inclui aprendizagem, educação e regras, o jovem costuma reagir com incompreensão e certa revolta, desinteressando-se pela escola, que é o seu primeiro modelo de sociedade organizada.


Sinais

As notas  e a falta de ânimo para fazer a lição de casa e ir à aula são demonstrações claras de que o ambiente escolar –ou os estudos– não estão estimulando o adolescente. A questão é que nem sempre os filhos explicam para os pais o que está acontecendo.

“Se estivar acontecendo algo relacionado aos colegas –como ser vítima de brincadeiras ou ter dificuldade para se enturmar–, às vezes, o adolescente não fala por vergonha ou mesmo por medo de os pais irem à escola. Situação que, para ele, poderia causar constrangimento”, afirma Miriam Barros, psicodramatista e terapeuta familiar, da Sociedade de Psicodrama de São Paulo.

De qualquer forma, o principal a fazer é criar, em casa, um ambiente confortável e seguro para que seu filho sinta-se à vontade para contar o que está acontecendo. Propor um diálogo mais aberto é essencial. “Na correria do dia a dia, nos poucos momentos em que estamos com os filhos, fazemos cobranças. E isso acaba virando uma rotina. Além das exigências, os pais acabam não desenvolvendo outro tipo de conversa, e os filhos acabam se afastando”, diz Miriam.

Para quebrar esse hábito, é importante ter momentos divertidos e de parceria, como sair para tomar um lanche, criar situações em casa que fujam da rotina, proporcionar conversas mais descontraídas. “São nessas horas que os filhos revelam alguma coisa que, de outra forma, não falariam”, fala a especialista.

É importante que o jovem sinta que os pais fazem parte da vida deles. “Mesmo que não estejam presentes em tempo integral, a presença afetiva pode acontecer. O jovem saber que, mesmo à distância, os adultos estão preocupados e se importando com ele faz com que se sinta seguro para se abrir”, declara a professora e psicanalista Marcia Nader, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Psicanálise e Educação da USP e autora do livro “Déspotas Mirins – O Poder nas Novas Famílias” (Ed. Zagodoni).

Lembre-se que ouvir e promover um diálogo não significa que você vai fazer o que seu filho quer. “Abrir para uma conversa significa que você está do lado do seu filho e que, juntos, podem buscar soluções”, diz a psicanalista.

Aplicar castigos não é o ideal –coisa que, na prática, muitas vezes acaba acontecendo. “Quando o filho não quer fazer algo que os pais desejam, o resultado é um choque entre os dois lados. Sendo assim, cabe aos adultos dar o primeiro passo para acabar com a guerra, promovendo uma abertura em que seja possível explicar os pontos positivos e negativos daquela situação”, fala Miriam.

Tipo de escola

Segundo a psicopedagoga Augusta, cada escola tem a sua cultura e seu processo educacional e os pais devem procurar, na medida do possível, combinar esses elementos com o perfil do próprio filho. “Se o seu filho for tímido, por exemplo, seria interessante estudar em uma escola mais liberal. Se ele não tem limites, uma escola mais rígida poderá ajudá-lo”, afirma a especialista.

De todos os fatores citados, quando algum deles se torna insuportável e faltar na escola vira um hábito, algo está acontecendo. Nesse caso, procurar orientação profissional pode ajudar o adolescente e os pais a compreenderem a situação. “Existem casos em que o jovem se sente mais à vontade para se abrir com alguém que ele não conhece”, diz Miriam.

E, se for o caso, trocar de escola pode ser uma solução. “A família deve compreender que, eventualmente, é melhor uma troca de escola do que submeter o adolescente a um ambiente que não lhe é adequado. Para isso, é necessário, às vezes, experimentar mais de uma instituição, para encontrar alguma que se aproxime mais dos desejos do adolescente e de sua família”, diz Augusta.