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Antes de engravidar, quem bebe ou fuma precisa passar por 'detox'

O ideal é suspender a contracepção após parar de usar qualquer substância tóxica - Getty Images
O ideal é suspender a contracepção após parar de usar qualquer substância tóxica Imagem: Getty Images

Rita Trevisan e Suzel Tunes

Do UOL, em São Paulo

16/10/2014 07h15

O exercício da maternidade exige muitas mudanças na vida da mulher –a começar pelas físicas. A gestação provoca alterações hormonais e metabólicas importantes e, por isso mesmo, antes de engravidar, é preciso garantir que a saúde esteja em dia. O cuidado inclui abandonar hábitos como fumar e beber, que podem ser perigosos para o bebê em formação.

Fábio Sakae Kuteken, ginecologista da rede de Hospitais São Camilo, de São Paulo, explica que o período de formação do feto é compreendido entre a segunda e a 12ª semana de gestação. “Nesse intervalo, ocorre uma intensa multiplicação celular e podem acontecer também malformações. Considerando que a confirmação da gravidez é feita quando a mulher se encontra com, pelo menos, de duas a três semanas de gestação, o ideal seria interromper o uso de substâncias químicas antes mesmo de parar o método contraceptivo”, afirma o médico.

De maneira geral, assim que a mulher interrompe o uso de alguma substância nociva ao bebê, acaba o perigo. “Para a maioria dessas substâncias, a interrupção imediata já seria eficaz na prevenção de malformações. O errado é achar que o uso em baixas doses não causa problemas ao bebê”, afirma Kuteken. É o caso, por exemplo, do álcool, para o qual a ciência ainda não conseguiu estabelecer uma margem segura de consumo durante a gestação.

O risco de beber é o desenvolvimento da SAF (Síndrome Alcoólica Fetal), que pode acarretar diferentes níveis de comprometimento ao bebê –de baixo peso no nascimento à redução do número de neurônios.

Exames na gravidez

Infográfico mostra exames que gestante deve fazer ao longo dos nove meses

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Segundo a ginecologista Sandra Maria Alexandre, professora do Departamento de Obstetrícia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o álcool atravessa de forma fácil a barreira da placenta, e o fígado embrionário não tem enzimas adequadas para metabolizá-lo. O mesmo ocorre durante o período de aleitamento. “O álcool passa direto para o leite e vai para o fígado do bebê.”

Silvana ainda acrescenta que álcool e drogas como cocaína e crack podem causar dependência química ao feto. Ao nascer, a criança poderá apresentar síndrome de abstinência, com sintomas como choro e irritabilidade excessivos.

Fertilidade em risco

O uso de cocaína e maconha também tem sido relacionado a problemas como diminuição da fertilidade (tanto feminina quanto masculina), prematuridade e baixo peso, como também a danos no desenvolvimento neurológico. A maconha pode afetar a atenção, a memória e o raciocínio, e a cocaína atua no sistema nervoso central, estimulando o sistema noradrenérgico.

“A ativação desse sistema, além de outras coisas, aumenta a frequência cardíaca e contrai os vasos sanguíneos, levando a uma redução da chegada de oxigênio e nutrientes para a placenta e o feto. Também pode levar a malformações do sistema nervoso central do feto, alterações da face, do coração, do aparelho digestivo, urinário e afetar o desenvolvimento neuropsicomotor da criança”, declara Kuteken. “Mas se a mulher conseguir interromper o uso dessas substâncias antes da gravidez, não terá problemas”, completa o especialista.

Fumar é um dos comportamentos mais prejudiciais à gestacão, além de também diminuir a fertilidade tanto feminina quanto masculina. “Os vários componentes do cigarro causam danos tanto para a mãe quanto para o feto. Sabe-se que a nicotina diminui o fluxo placentário e a circulacão fetal, causando baixa oxigenação e a desnutrição do bebê. O monóxido de carbono reduz a oferta de oxigênio materno e fetal e o chumbo é uma neurotoxina. Além disso, alguns hidrocarbonetos encontrados no cigarro podem provocar mutações”, diz o ginecologista Fábio Kuteken.

Planejamento

Segundo a ginecologista Silvana Maria Quintana, professora da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), o ideal seria que todas as mulheres planejassem a gestação com, pelo menos, três meses de antecedência, começando com uma consulta médica.

“O profissional de saúde vai avaliar a história pessoal da paciente (se faz uso de cigarro ou outro tipo de droga, o tipo de trabalho que realiza etc.), a história obstétrica (se é a primeira gestação ou se teve problemas em gestações anteriores, por exemplo) e a história médica (para diagnosticar ou prevenir doenças perigosas ao bebê).”

Nessa consulta, chamada de pré-concepcional, o ginecologista também realizará um exame físico geral e pedirá exames laboratoriais. “Infelizmente, essa consulta não é rotina em nossa população. Aliás, na maioria dos serviços públicos, a paciente já chega grávida com mais de três meses”, diz Silvana.

O que essas gestantes não sabem é que, por um descuido que poderia ser prevenido, correm o risco de ter um bebê com malformação, resultado de uma doença não tratada ou mesmo do consumo de substâncias químicas que afetaram o embrião.

Exames

Além dos exames ginecológicos de rotina, para prevenir câncer de colo do útero e mama, a mulher que planeja a gravidez deve realizar exames laboratoriais para identificar possíveis doenças crônicas ou infecciosas. Na lista de avaliações básicas estão sorologias para rubéola e toxoplasmose (doenças que podem provocar problemas neurológicos no bebê) e testes para a identificação de doenças sexualmente transmissíveis, como sífilis e HIV.

Se a gestante tiver o vírus da Aids, por exemplo, é possível evitar que a doença seja transmitida ao bebê. Exames para outras doenças sexualmente transmissíveis não costumam fazer parte da lista de rotina, mas podem ser solicitadas quando houver suspeitas de contaminação, pois também interferem na fertilidade e na saúde do bebê.

De acordo com o ginecologista Fábio Kuteken, o herpes, por exemplo, pode ocasionar problemas no desenvolvimento fetal, como encefalite herpética (uma grave infecção cerebral) e até trabalho de parto prematuro. Já a clamídia e a gonorreia podem causar infertilidade e aumentar o risco de gravidez ectópica (nas trompas). A gonorreia também pode provocar uma grave lesão ocular no bebê.