Bobbi Brown Beach lembra o lado incômodo e nostálgico da praia

por Chandler Burr, do "The New York Times" *
Notas Perfumadas

  • Criadora: Bobbi Brown Gênero: Feminino Avaliação:

A perfumaria literalista está em todo lugar. A linha Aqua Allegoria, de Jean-Paul Guerlain, por exemplo, casa íris e figo. Pode-se sentir o cheiro sedoso da íris e o cheiro do figo – um suculento e delicioso holograma de um figo, cuja polpa doce surge quando a faca corta o fruto ao meio – e pode-se sentir o perfumista equilibrando esses dois cheiros. É como cheirar uma balança, com seus dois lados abastecidos de raiz de íris e de fruta, cada um distinto em seu prato de metal, mas se encontrando em pleno ar.

Porém, os artistas que criam trabalhos literalistas tem outras opções. Marcel Duchamp notoriamente amava a pintura das sopas Campbell’s de Andy Warhol porque elas libertaram a arte da tirania da representação pictórica: “Se um homem pega 50 latas de sopa Campbell’s e as coloca em uma tela, não é a imagem que enxergamos que importa”, ele disse. “O que importa é o conceito que mostra as 50 latas de sopa Campbell’s em uma tela.”


Com Bobbi Brown Beach, outro perfume literalista, o perfumista Claude Dir cria um atalho entre as duas abordagens. O cheiro de praia, que Brown escolheu como tema, dita a forma do trabalho: o desafio que Dir enfrentou foi definir qual exatamente era o cheiro da praia. Diferente de Warhol, Dir está evidentemente interessado na imagem olfativa. Mas ele não está interessado na abordagem hiperrealista de Guerlain. Sim, Guerlain mostrou sua maestria técnica ao reproduzir dois objetos específicos com precisão fotográfica, e então casá-los bem – mas com Beach, Dir pegou um único objeto (à medida em que a praia pode ser chamada de objeto), colocou na sua frente e acrescentou um toque pessoal. Ele jogou direito, e ao mesmo não o fez.

Para começar, Dir resolveu que Beach evocaria o cheiro do bronzeador Coopertone. Eu não ficaria surpreso se Brown tivesse levado um exemplar como amostra para ele em seu primeiro encontro de criação. É um bom ponto de partida como qualquer outro. O cheiro nítido de flor de laranjeira do Coopertone é muito americano; por comparação, os protetores solares europeus, como Bain de Soleil, possuem cheiros mais escuros - menos florais, mais robustos e mais abstratos.

A partir dali, Dir modificou o objeto, criou uma sutil inflexão. O que ele fez não ficou muito claro, mas pode-se sentir que é diferente. Poderia ser o cheiro do calor que sobe da areia. Poderia ser a água do mar. Aposto que ele acrescentou uma boa dose de metilbenzodioxepinona, mais conhecida como Calona 1951, ou como a molécula oceânica da perfumaria. Mas a menos que você esteja com a fórmula na sua frente, nunca se sabe. O que quer que Dir tenha acrescentado, aquilo distorce a imagem olfativa de uma praia o suficiente para que possamos inventar uma parte da história.

Em termos técnicos, Beach não é excelente. Ele tem relativamente pouca fixação na pele, e sua intensidade é delicada. Mesmo você passando o perfume 20 minutos antes de uns amassos furtivos atrás das dunas de areia, ainda assim não tenho certeza se ele acrescentaria algum tipo de elemento olfativo excitante. Certamente não é esteticamente inovador.

Por outro lado, sua estrutura se mantém muito bem, inteira, e em um dia cinzento de inverno, ele nos transporta imediatamente para as férias. No final das contas, Beach permite que você, mesmo que rapidamente, projete suas próprias memórias e desejos – a Riviera Francesa, o paraíso de Mikonos, a Costa Amalfitana na Itália, ou Ko Pi Pi, na Tailândia - resumindo, ele traz à mente todas as vezes em que você esteve usando muito pouca roupa, deixando a areia entrar em lugares impróprios, tomando cuidado para não se bronzear demais, sentindo o cheiro da água e da brisa, e amando muito aquilo tudo.

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