Com o figo como matéria olfativa, Wild Fig da Henri Bendel equilibra realidade com fantasia

por Chandler Burr, do "The New York Times" *
Notas Perfumadas

  • Frasco do perfume Wild Fig da Henri Bendel
    Criadora: Henri Bendel Gênero: Feminino Avaliação:

Vários verões atrás eu caminhava por uma antiga vila grega no sul da Turquia que havia sido abandonada durante a guerra contra a Grécia, entre os anos de 1919 e 1922. Sua população fugia dos conflitos da costa Anatólia. Acerca e por entre as casas abandonadas, ainda misteriosamente intactas sob o céu azul-cobalto do Mediterrâneo, surgiam figueiras, uma atrás da outra. Contra o azul brilhante, surgiam as folhas, grandes e arredondadas, parecendo saídas da história de Alice no País das Maravilhas. Quando rasguei uma folha ao meio, ela liberou um cheiro maravilhoso, que mais parecia o de um jovem graveto quebrando: morno, doce, fresco, verde.

A fruta da figueira tem um cheiro notavelmente diferente. Havia figo por todos os lados – verdes, amarelados, arroxeados, pendurados nos galhos ou caídos pelo chão. Pegamos os que haviam caído e que estavam perfeitamente maduros, sem marcas e bem roxos. Pegamos muitos, e conforme alguns caíam de novo, liberavam um cheiro vagamente doce.

 

A casca roxo escura dos figos maduros ficam cobertas por uma névoa branca. Se você corta só a casca, a fruta libera um líquido característico com cheiro argiloso e levemente amargo. Mas corte um figo inteiro ao meio: o perfume é mais forte, mais doce, mais grosso. Figos são como linguiças – membranas recheadas da fruta. É quase possível imaginar alguém pegando potes para geleia, cuidadosamente abrindo essas pequenas gotas que lembram o roxo delicado das abóbadas das igrejas russas, transferindo a fruta para os potes e mexendo, até chegar no ponto de ebulição para então fechar hermeticamente os potes novamente. Figos maduros têm um cheiro frutado, embora diferente do cheiro tropical das bananas ou dos abacaxis. Os figos têm cheiro reconfortante, assim como as maçãs, apesar dos figos verdes possuírem o cheiro penetrante das laranjas ou das tangerinas. Para a maioria dos americanos, figos frescos são um tanto exóticos. Para os antigos gregos, eles eram presentes, iguarias.

 

Nos anos 90, o odor de figo – as folhas, os galhos, as frutas verdes, as frutas roxas e maduras – tornaram-se uma pedra de toque olfativo extremamente popular. A primeira encarnação surgiu em 1994 – um perfume chamado Premier Fig, para l’Artisan Parfumeur – embora sua criadora, a perfumista Olivia Giacobetti, não tenha tentado elevar o status do figo para algo fenomenal antes de 1996, quando projetou Philosykos para a Diptyque. “Philo” é “amor” em grego, e “sykos” significa “figo”.

 

Assim como Bach compondo as variações sob um tema que se tranformam em uma fuga, Giacobetti apresentou diferentes aspectos do figo. Ambos são excelentes. Premier Figuier se concentra mais na fruta em si, com notas verdes cortando a doçura, enquanto Philosykos exibe a árvore, a fruta, a terra quente e aspectos da seiva, da casca de árvore e das folhas escuras e molhadas da figueira. Figuier, de James Heeley, lançado em 2004, é outra variação maravilhosa, mais clara e pura que as de Giacobetti – é a clarineta de Philosykos.

 

Henri Bendel acaba de aparecer com sua mais recente interpretação, Wild Fig. Belamente construída, esta fragrância apresenta um figo maduro e morno graças ao sol mediterrâneo. A fragrância abre com coco, luxuosamente rico e muito doce. Mas estas notas se atenuam com o tempo, transformando-se em algo mais sutil e refinado.

 

Como seus predecessores, Wild Fig pertence a uma nova geração de perfumes hiperrealistas ou surrealistas. Se bem feito, assim como Wild Fig é, estes perfumes são verdadeiros deleites.

 

Wild Figtomou como ponto de partida a pureza daqueles figos da vila mediterrânea vazia, e os recriou. Ele embelezou, decorou e os transformou, mas os manteve reconhecíveis. A beleza de um perfume como este vem da conquista do equilíbrio entre realidade e fantasia. O figo – a árvore, o fruto, as folhas, os galhos, a brisa do mar, o sol e a terra quente – é a matéria olfativa perfeita para tais experimentações e brincadeiras.

 

Tradução: Erika Brandão

Tradutor: Érika Brandão

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