Frasco de Ninfeo Mio contém todo o mistério e a mágica de uma noite de verão
por Chandler Burr, do "The New York Times" *
Notas Perfumadas
- Criadora: Annick Goutal Gênero: Feminino Avaliação:
Há anos, aqueles com mais traquejo consideram a coleção de perfumes de Annick Goutal um pequeno tesouro escondido. O caráter cult não vem do design ou graças ao direcionamento das campanhas de marketing da maison, e sim de uma aura mantida pelos próprios consumidores de Goutal: ouvi pessoas sussurrando o nome do perfume Goutal que estão usando, como se estivessem protegendo a senha do cartão do banco.
Mas isso é um complemento para uma coleção que tem sido extravagante desde seu nascimento. As fragrâncias de Goutal têm uma qualidade de contos de fadas e duendes, como se exploradores as tivessem descoberto em clareiras encantadas (os frascos, geralmente de vidro canelado, ficam entre a art nouveau e a belle époque, criando um efeito intensificado). Um personagem de conto de fadas poderia usar o fresco e agradável Chevrefeuille, cuja perfumista Isabelle Doyen construiu em colaboração com Camille Goutal, filha de Annick e chefe da marca. O mesmo vale para o relaxante Gardenia Passion ou para o delicado Petite Cherie.
Desde sua criação, em 1981, a fragrância mais vendida da maison tem sido Eau d’Hadrien, construída por Henri Sorsana, da Robertet (com sede em Grasse, uma cidade perfumista por natureza) com Annick Goutal como diretora de criação. Pessoalmente, Eau d’Hadrien nunca me arrebatou. É uma água fresca bastante adstringente, implacavelmente revigorante e ultraclássica: a fórmula é, estritamente, para construcionistas que embarcaram no clichê do cítrico com complementos aromáticos e sem nada para corrompê–la – nem mesmo uma folha de eucalipto ou de dente-de-leão. Sendo assim, é uma fragrância profundamente vitoriana, tão bela – e tão enfadonha – quanto o som de uma senhora inglesa lhe dizendo para sentar direito e falar pausadamente.
A coleção Goutal também inclui perfumes gourmands como Vanilla Exquise (outra colaboração entre Doyen e Camille Goutal) e Sables, criado por Sorsana e Doyen com Annick Goutal. Este, como uma pintura de Rothko, contém poderosos blocos de abstração figurada, e gera impacto nas áreas primais do cérebro.
Com Ninfeo Mio, a maison voltou às suas origens e produziu um perfume de adorável transcendência e magia. Queen Mab – ou qualquer uma das fadas de “Sonhos de uma Noite de Verão” – o usaria com prazer. Raramente senti um perfume com maior capacidade camaleônica. Ninfeo Mio (italiano para “minha vitória-régia”) sai do frasco cheirando o ar de verão sobre uma poça: úmido, leve e delicado, ecoando um delicado caminho de videiras verdes e a fragrância dos trevos florais de Chevrefeuille. Se você tirar dali o ângulo comestível e resinoso de Un Jardin sur le Nil, de Hermès, o resultado não fica longe de Ninfeo. Mas o perfume é fundamentalmente Goutal, e é provavelmente mais preciso dizer que se você trocasse o rigor de Eau d’Hadrien por ternura, você chegaria em Ninfeo.
O perfume misteriosamente se transforma. Eu o usei por vários dias e em determinado momento fiquei surpreso ao descobrir uma poderosa baunilha durante sua difusão. Desde então, fui incapaz de senti-la novamente. Outras vezes, senti fortes notas cítricas – interessante, já que os cítricos geralmente somem rapidamente. (Deve-se dizer que para um trabalho da escola verde/natural/fresca, a fragrância possui excelente fixação na pele.) Em outras ocasiões, Ninfeo canaliza figo, tão claro como o dia, mas outras vezes exala odores de cominho e odores animalescos (apesar de absurdamente sensuais). Eles se purificam através da baunilha e nos transportam para o cítrico, como a água que passa pela vitória-régia.
Este pode ser um maravilhoso presente sazonal (ou aquele presente que você acaba guardando para si mesmo): um pequeno frasco contendo todo o mistério e a mágica de uma noite de verão.