Os perfumes Comme des Garçons são, invariavelmente, tão fortes – tão inventivos, ousados, tão deliciosamente ímpares, belos de uma forma suntuosa, surpreendente, e com uma alta qualidade de fazer cair o queixo (igualados somente por Hermès, Chanel e The Different Company) – que as suas experimentações com fragrâncias sempre chamam minha atenção. Veja, como exemplo, a mais recente delas: uma colaboração com a Artek, a empresa finlandesa de móveis. A Artek, uma verdadeira instituição finlandesa, foi fundada em 1935 por quatro jovens idealistas; um deles, Nils-Gustav Hahl, anunciou que seria “um centro de vendas e propaganda de uma nova ideologia em habitação.” A ideologia em questão é a promoção de uma “cultura moderna de habitação” – um ambiente dinâmico onde se nutre as necessidades de bem estar físico e emocional de um ser humano.

No que tange aos negócios, essa ideologia tem como princípio que a empresa venda moveis que reflitam essa cultura, e a Artek (cuja sede ainda é na Finlândia, mas agora de propriedade do grupo sueco Proventus AB) começou a produzir cadeiras e mesas feitas de madeira e materiais sintéticos que combinam a clássica parcimônia escandinava com um design futurístico, inventivo.

 

Os fundadores da Artek acreditavam em uma síntese nobre da arte e do design em áreas que vão do planejamento urbano à arquitetura. Naturalmente, a empresa possui uma razão mais orgânica para fazer uma incursão no mundo da perfumaria. Se você tem interesse em mudar o espaço sensorial ao seu redor, é obrigatório levar o olfato em consideração.

 

Trabalhado sob a direção criativa do gênio da Comme des Garçons, Christian Astuguevieille, o talentosíssimo perfumista Olivier Pescheux criou um perfume que é uma evocação virtualmente perfeita dos móveis Artek. Standard (o nome vem das ideias da Artek sobre design de móveis) aproxima o perfume e o maravilhoso obsoletismo orgânico de madeiras leves arenosas como cedro e carvalho envelhecidos. E se fosse possível distilar a fragrância do grafite militar na forma de uma essência, ela certamente também estaria em Standard.

 

Há uma analogia perfeitamente exata para a fórmula amadeirada com materiais sintéticos e metais de Standard: o cheiro de uma dessas lojas de materiais e utensílios, no estilo “faça você mesmo”. Nunca entendi por que nenhuma marca tenha lançado ainda uma fragrância chamada “Loja de Materiais e Utensílios” - teria sem dúvida um sucesso maior entre o público masculino do que Drakkar Noir.

 

Talvez agora, com Standard, tenhamos finalmente conseguido. Caso já tenha existido uma loja ferramentas e utensílios de ponta – cujo inventário inclua uma seção de alta marcenaria, brocas de metal polido, caixas de papelão com um aroma deliciosamente forte e ferramentas com um design futurista – Pescheux criou exatamente o perfume que seria possível sentir ao se entrar em uma loja dessas. É hipnotizante, mas também silencioso e suave como o cair da neve.

 

Inventivo, básico, simples e solto como as esferas dentro de um rolamento, Standard é uma das fragrâncias mais estruturalmente perfeitas que eu já senti. É paralisante, mas não da mesma forma que um luxuoso perfume francês. Em vez disso, ao se envolver em sua silenciosa nuvem de titânio, é possível perceber Standard da mesma forma que se perceberia uma curvatura do espaço-tempo. Invisível e visceralmente poderoso. É como uma carícia. Um perfume que nutre a necessidade de bem estar físico e emocional do ser humano.

Tradutor: Fabiana Souza