Construção e reforma

É possível construir usando madeira na estrutura?

Fernando Forte e Rodrigo Marcondes Ferraz

Fernando Forte e Rodrigo Marcondes Ferraz

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    A correta utilização da madeira na construção é benéfica ao meio ambiente

    A correta utilização da madeira na construção é benéfica ao meio ambiente

Muito utilizadas na Europa e nos Estados Unidos, as estruturas de madeira ainda têm o seu uso cercado de preconceitos no Brasil. Por aqui a madeira é tida como material menos resistente, caro, pouco ecológico, confiável e durável, o que faz com que a sua utilização fique quase que unicamente restrita aos telhados.

Todo este preconceito, entretanto vem do fato de que são poucos aqueles que realmente sabem utilizar este material da maneira correta. As faculdades de arquitetura e engenharia falam e estudam pouco este material. Além disso, o mercado da construção civil – caracterizado pelo conservadorismo e pela pouca afeição à inovação – prefere as tradicionais estruturas de concreto armado para resolver qualquer situação.

Características
Para se utilizar a madeira como elemento principal da estrutura de uma casa ou edifício, primeiramente é necessário conhecer algumas das suas características. A leveza é uma delas, além da limpeza do canteiro, já que a construção das formas ou o cimento não são necessários nesse sistema construtivo. A adoção desta estrutura em terrenos inclinados ou de difícil acesso é bastante interessante, já que as peças chegam prontas à obra, a montagem é rápida, não necessita de escoras e, quando pronta, a própria estrutura funciona como um gabarito para as próximas tarefas do canteiro, como vedações, instalações, cobertura etc.

Tal qual o aço, uma viga de madeira apresenta grande resistência à tração. Desta forma, muitas vezes conseguimos vencer vãos razoáveis com peças mais esbeltas do que se a estrutura fosse feita em concreto armado. Entretanto, nas peças estruturais de madeira as dimensões são limitadas. Em geral é difícil encontrar no mercado peças com mais de 6 metros de comprimento. Sendo assim, ainda fase de projeto, o arquiteto e o engenheiro calculista devem estudar o comportamento da estrutura para tirar o maior proveito deste material. A associação de peças, como acontece nas populares tesouras dos telhados, ou a associação da madeira a peças metálicas como vemos nas vigas-vagão, por exemplo, permitem que grandes vãos sejam vencidos com as peças comuns de mercado. Para maiores dimensões podem-se utilizar as vigas laminadas ou as vigas compostas, formadas por uma associação de lâminas de madeira ou vigas menores também de madeira coladas. Muito utilizado fora do Brasil, inclusive na cobertura de fábricas e estádios, por aqui este sistema ainda se apresenta pouco competitivo pelo seu elevado custo. De qualquer maneira, um projeto bem detalhado da estrutura é ainda mais importante no caso da adoção da madeira.

Principais cuidados
A água e o fogo são os principais inimigos da madeira. Portanto algumas precauções devem ser observadas para garantir integridade destas estruturas.

A água é responsável pelo apodrecimento da madeira. Para que isto não ocorra, são bem vindos os grandes beirais das lajes ou telhados. Apesar de até poder ficar em contato constante com a água (como no caso de um barco) o material apodrece se molhar e secar constantemente. Por isso, é sempre recomendável isolar a madeira do solo através de sapatas de concreto, esperas metálicas que suspendam os pilares ou outras soluções existentes. A madeira não é recomendável para as construções de subsolos, por causa da excessiva umidade destas áreas.Um projeto bem feito de elétrica reduz consideravelmente os riscos de incêndios nas construções de madeira. Entretanto, numa construção bem feita, o risco do fogo é pequeno e muitas vezes estas estruturas resistem durante muito mais tempo antes de entrarem em colapso do que as tradicionais estruturas metálicas treliçadas de cobertura, que derretem em questão de minutos.

Os organismos xilófagos, popularmente conhecidos como cupins, também podem apresentar um risco às estruturas de madeira. Apesar das crenças populares, as madeiras brasileiras mais comumente utilizadas como estrutura, como o ipê, o jatobá, a maçaranduba ou o pequiá, apresentam grande resistência a estes organismos, que só as atacam quando há pontos de apodrecimento. Além disso, há uma série de produtos que podem ser aplicados à madeira para impedir o ataque de brocas ou cupins.

Ainda, devido ao fato de que a madeira se movimenta diferentemente dos outros elementos da construção, como alvenarias e caixilharia, a utilização de frisos ou cantoneiras metálicas é indicado para garantir a estanqueidade da construção e evitar trincas. O cuidado nos encontros da madeira com os demais materiais deve ser tomado ainda na fase de projeto.

Sustentabilidade
Ao contrário do que muitos pensam, a correta utilização da madeira na construção é extremamente benéfica ao meio ambiente, já que esta é um recurso natural renovável. Primeiramente, a exploração da madeira deve ser de baixo impacto ambiental, de acordo com a lei ambiental brasileira para a exploração racional das florestas nativas. Neste processo de manejo sustentável, a área disponível para exploração é dividida em grandes áreas, de cerca de 100 ha, que têm suas árvores identificadas e etiquetadas. Cada área é explorada durante um ano e só deverá ser trabalhada novamente após 30 anos, tempo suficiente para a floresta se recompor.

A madeira é o resultado da energia solar acumulada na fotossíntese. Assimilando o CO2 da atmosfera, a madeira fixa o carbono, que representa cerca de 50% de sua massa. Ao contrário do que se imagina, nas florestas virgens, não há absorção de CO2, pois o reservatório de carbono da floresta está cheio. Nas florestas exploradas economicamente, que apresentam constantemente árvores novas, este reservatório de carbono é esvaziado com frequência, acarretando a evolução constante de sua biomassa e o sequestro do carbono, considerado um dos vilões do efeito estufa. Podemos utilizar ainda nas construções a madeira de reflorestamento, como o eucalipto, que também não constitui nenhuma agressão ao meio ambiente e ainda contribui para os efeitos citados acima.

Comparando-se diferentes materiais comumente utilizados na constituição de estruturas das residências, no que se refere ao consumo de energia desde a fabricação da matéria prima até a montagem final da estrutura, verificamos que a madeira é novamente bem vinda, já que consome apenas 1/6 da energia consumida por uma estrutura de igual tamanho em concreto, 1/16 da energia desta mesma estrutura em aço ou incríveis 1/160 da energia, no caso desta estrutura ser constituída de alumínio.

Há que se lembrar ainda que construções tradicionais de concreto armado utilizam grande quantidade de madeira nas formas (que chega a representar 1/3 do custo total de uma estrutura de concreto) que depois é totalmente descartada ao meio ambiente na forma de entulho. Ou seja, desde que bem utilizado, este velho material conhecido do homem, continua cada vez mais atual.

Fernando Forte e Rodrigo Marcondes Ferraz

Fernando Forte e Rodrigo Marcondes Ferraz são arquitetos formados pela FAU-USP e sócios do escritório Forte Gimenes Marcondes Ferraz (www.fgmf.com.br)

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