Qualquer ideia criativa pode ser design? Conheça o conceito de "design aberto"
Alice Rawsthorn
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Gwangju Design Biennale
Código de barra com o DNA de um gorila apresentado no Projeto Internacional Código de Barra da Vida, parte da mostra "Unnamed", da Bienal de Design de Gwangju, na Coreia do Sul
LONDRES – o que eles têm em comum: um balde feito a partir de uma bola de basquete, o código de programação para um vírus de computador, uma prótese de perna barata e acessível, o plano logístico para um protesto político no Cairo, um código de barras ilustrando o DNA de um gorila e uma gaiola de metal transformada em uma casa provisória?
A resposta é que todos são identificados como exemplos não celebrados de design na "Unnamed" ("Sem Nome", em uma tradução livre, uma exibição que acontece até 23 de outubro na Gwangju Design Biennale, na Coreia do Sul. Com curadoria (sem a presença) do artista e ativista político Ai Weiwei, que foi preso durante a fase final de pesquisa, e que foi proibido de sair da China para participar da montagem, “Unnamed” explora o papel do design em projetos com os quais não seria tradicionalmente associado. A exibição argumenta que design não se trata unicamente da preservação dos designers profissionais, ele pode também ser o trabalho de cientistas, ativistas, programadores de computação, hackers e de qualquer outro que aplique ingenuidade, originalidade, pensamento estratégico e outras qualidades indispensáveis para o bom design.
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Uma interface de computador para o cérebro, desenvolvida pela empresa australiana Emotive
e apresentada na mostra "Unnamed", da Bienal
de Design de Gwangju, na Coreia do Sul
O conceito de design como um processo fluido e instintivo, aberto a todos, é cada vez mais popular. Alguns dos projetos de “Unnamed” também estão em outras exibições em andamento, incluindo a "Talk to Me", no Museu de Arte Moderna de Nova York e “Power of Making”, no museu Victoria & Albert de Londres. A ideia por trás do "design aberto" parece sensata, bem como generosa e inclusiva, mas quais são as implicações? Existe alguma vantagem em redefinir coisas que vem sendo descritas há tempos, aparentemente com êxito, como científica, política, tecnológica ou simplesmente criativa como design? E pode-se perder algo ao fazer isso?
Fluido e instintivo
Historicamente, o design era completamente fluido, instintivo e geralmente anônimo. A palavra “design” vem do Latim designare, que significa traçar, descrever e planejar. Mas o processo que hoje reconhecemos como design já vinha sendo praticado havia muito tempo, quando homens e mulheres pré-históricos procuravam melhorar seu dia a dia: ao produzir uma tigela de barro e usá-la como copo, por exemplo, ao invés de fazer conchinha com as mãos.
A primeira definição para “design” no dicionário Oxford remonta a 1548, como verbo que significa “indicar, designar”. Quase um século depois, “design” foi identificado no contexto profissional como “esboço preliminar para uma obra de arte: o plano de um edifício ou parte dele”. Desde o início da Revolução Industrial no final dos anos 1700, o papel do design profissional vem se expandindo incessantemente e numerosas disciplinas surgiram: gráfico, produto, software, transporte, multimídia, etc. A palavra “design” permaneceu como verbo (em algumas línguas) e como substantivo e manteve seu significado instintivo original, mas vem sendo usada principalmente dentro de um contexto comercial.
Ao longo dos anos, um crescente número de designers vem contestando a predominância comercial do design. Eles alegam que, embora a comercialização tenha feito o design parecer mais importante ao lhe fornecer um status particular, ele também o restringe quando limita os designers a papeis determinados. As mesmas restrições, segundo eles, previne a sociedade de reconhecer o potencial do design em atacar desafios sociais, políticos e ambientais importantes.
O "designer inclusivo"
O independente designer/ inventor/ arquiteto/ engenheiro americano R. Buckminster Fuller levantou este argumento nos anos 1920. Depois, propôs a criação de um novo gênero de “designer inclusivo”, encarregado de antecipar futuras necessidades e organizar recursos para benefício de todos. Fuller também sustentava que os anos entre 1965 e 1975 seriam chamados de “A Década da Ciência do Design Mundial”.
Seus planos não se realizaram (tampouco suas propostas para uma cidade flutuante e um carro voador), mas a visão de Fuller de um papel mais significativo para o design resistiu. Sua influência é evidente em “Massive Change” [Mudança Maciça, em uma tradução livre], uma série de publicações, exibições e debates iniciados pelo designer canadense Bruce Mau em 2004. Temas semelhantes desde então vêm sendo explorados em outros lugares. O argumento a favor da expansão da definição do design além de sua aplicação profissional é hoje amplamente aceito (apesar dos esforços de um grupo rabugento de “profissionais” do design da velha guarda em rejeitá-lo), mas para que fim?
Um dos benefícios é que designers anônimos de peças engenhosas como a bola de basquete que vira balde podem finalmente ser reconhecidos. Seria rude e egoísta ignorá-los, embora eu me questione como cientistas e programadores de computador se sentem ao serem aclamados como “designers”. Provavelmente como um amigo físico que, depois de ter sido parabenizado por um escultor por “ser um artista de verdade”, respondeu: “Obrigado, mas estou feliz em ser cientista.”
Linha divisória
Outro benefício, pelo menos para os designers, é que eles poderiam trabalhar mais extensamente, digamos, ao tratar de problemas sociais ou ao serem integrados em programas de pesquisas científicas. Os rabugentos da velha guarda reclamam que isso vai desprofissionalizar o design, mas designers mais “abertos” estão dispostos a arriscar pela oportunidade de lidar com assuntos desafiadores. Eles também argumentam que a sociedade como um todo está pronta para ganhar mais com o uso mais amplo do design. Como grupos de design social como Participle ou Project H já mostraram, aplicar elementos do processo do design pode ajudar a encontrar meios mais eficientes de cuidar dos mais velhos e de motivar os mais jovens.
Um possível problema ao aceitar uma definição mais ampla do design é decidir onde estabelecer a linha divisória. Do contrário, praticamente tudo que tenha um sopro de criatividade, pensamento lateral, inovação ou qualquer outra característica do design pode ser considerado uma obra de design. Se você segue uma receita quando está cozinhando, não pode alegar que está criando a comida, mas poderia se estivesse improvisando. A questão crítica é se a comida vai ter um gosto melhor ou não. A inclusão do design no processo de desenvolvimento vai fazer uma diferença positiva?
Se não, o “design aberto” pode estar se arriscando em não ter propósito. Mas os projetos de design social de sucesso provaram que o design pode ser útil naquela área. E quando falamos de pesquisa científica, o conhecimento do especialista é, sem dúvidas, o fator mais importante, mas o envolvimento de designers pode ajudar a identificar aplicações construtivas para os resultados. Quanto à comida, ela vai ficar mais saborosa se o cozinheiro for ousado e mais criativo? Não necessariamente, mas, talvez, sim.
Tradutor: Érika Brandão